8 de maio de 2008

Segredo

Ele segurava firme a carta na mão na tentativa de aliviar a tensão que não podia transmitir a ninguém. Muito menos a ela que estava prestes a chegar.
Não se ouvia soluços, ele não podia vacilar a essa altura do campeonato, afinal já fazia quase dois anos que Diguito havia partido.
Acariciou a superfície do envelope que naquele dia estava mais pesado que o convencional, e não ousou abri-lo antes de olhar para os lados conferindo se estava realmente sozinho. Aconchegou-se na cabeceira da cama, abriu a carta já meio surrada e pôs-se a ler.
Engolia as frases. Lia-se "eternamente" e já pulava para a outra linha; lia-se "prometo" e pulava. E assim foi até chegar ao fim do escrito. Acontece que aquelas palavras de certa forma o incomodava e até mesmo já sabia a ordem que elas estavam dispostas no papel. O que ele queria mesmo era poder apreciar a dor por mais tempo, o tempo que restaria até ouvir o salto alto da mulher subindo as escadas.
No mês passado, enquanto lia mais uma vez os escritos, sugava as palavras de esperança que se repetiam linha a linha para ver se elas finalmente entrariam na sua cabeça. Inutil. Um mês depois ele percebera que ainda não era capaz, e também já não fazia mais sentido tentar. Os anos já haviam se passado mesmo.
Ele não gostava de poesias assim como Diguito, mas jurava que alguma poesia era formada quando lia as cartas dele. Até zoava resolvendo declamar em voz grossa e alta os trechos mais melosos do papel. Na época riam juntos. Diguito sempre o chamava de exagerado quando ele fazia esses gracejos.


continua...

3 comentários:

Anônimo disse...

eita esse novo para mim hauahuaha mas achei da horaaa entao beijo

Anônimo disse...

até o momento achei muito bom, mas aguardo pela continuação para que possa dar um parecer completo.....

Anônimo disse...

Gostei bastante do texto. Me pareceu bem saudoso. Bem nítido, bem vivo. Dá pra entrar na mente da personagem. Sempre as mesmas palavras... posso imaginar o que estava escrito nessa carta.

Mas uma coisa é certa:
http://www.secrel.com.br/jpoesia...ia/ facam83.html

Melhor frase do texto:
"o que ele queria mesmo era poder apreciar a dor por mais tempo..."

Parece que só na dor as pessoas existem. O difícil mesmo é quando já não existe mais nada, nem dor para sentir.
Saudades da dor. (espero um dia me arrepender de ter dito isso)

Cadê a continuação? Tõ esperando, hein!

Te amo.